terça-feira, 9 de outubro de 2007

Puerto Eden

Quando, a bordo do Puerto Eden, saí de Puerto Montt, estava a cair a noite. Já depois de estar escuro, ainda pude ver algumas luzes de casas nas margens do canal em que navegávamos. Depois de jantar voltei a sair para a coberta mas já só vi escuro, a mais profunda penumbra de uma noite sem luar. Sem casa nem ruas, apenas o escuro completo que indicava a ausência de pessoas ou povoações. E assim foi durante os dois seguintes dias de viagem. Ao longo de mais de 1000 km, muitas vezes com terra de um lado e do outro do barco, não se viu uma única casa, uma rua, um sinal de civilização. Nada. Só altas montanhas, neve e gelo. Um deserto frio. Eu pensava que o barco iria directo até Puerto Natales, só a conversar com a mãe da minha simpática amiga Bi é que eu percebi que não, o barco iria parar, um dia antes de todos desembarcarmos, numa pequena povoação isolada de quase tudo: Puerto Eden, o nome do barco.

A mais de um dia de viagem de Puerto Natales, a povoação mais próxima, Puerto Eden é visitada uma vez por semana pelo barco em que eu viajei, o único barco local a atravessar aquelas paragens, para alem dele só um ou outro cargueiro. Por isso no porão do Porto Eden viajava um pouco de tudo. Quando nos aproximamos da povoação subi, como toda a gente, para poder ver bem a pequena aldeia com cerca de 150 habitantes, literalmente plantada nas margens daquelas águas geladas. Quando o barco parou, vimos uma série de pequenos barcos e botes que depressa se dirigiram para nós. Não consegui conter a curiosidade e fui para uma zona que me estava proibida, a zona em que descarregaram a mercadoria destinada a Puerto Eden, e por onde saíram também as duas únicas passageiras com este destino. Havia de tudo: caixas grandes e pequenas, muitos bidões com combustível, madeiras e outros materiais, fruta e vegetais, muitos, e caixotes que não consigo sequer imaginar o que continham. Disseram-me que em outras alturas do ano o barco também transporta animais vivos para Puerto Eden.

Foi aí que registei também uma das imagens mais ternas de toda esta viagem, no momento em que a Bi e a mãe chegaram a essa zona e a Bi, muito antes de abraçar o pai, corre, numa alegria difícil de descrever, para abraçar o irmão, um pouco mais velho do que ela. Não se viam à duas semanas, desde que a Bi e a mãe se viram obrigadas a deslocar a Puerto Montt para tratar de um assunto qualquer. Fiquei com a sensação que qualquer que fosse o assunto elas teriam sempre de lá ir. O pai da Bi está destacado pela policia em Puerto Eden, e a família teve de o seguir. Fiquei com a sensação que qualquer assunto é um bom assunto para uma pequena ausência. Para um sitio onde seja possível correr...

Após a descarga de tudo, embarcaram três ou quatro passageiros com destino a Puerto Natales. A Bi foi para terra num pequeno bote e tão entretida estava com o irmão que nem olhou para trás para me dizer adeus. Ainda bem. Era quase noite e na manhã seguinte a viagem acabou em Puerto Natales.











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